BEIRA INTERIOR NORTE
Bafoeiradas da aragem traziam pelos ares a moinha
dos centeios padejados e o rescendor da macela e
da labaça que ressequiram nos campos gadanhados.
Cortavam o céu alto bandos de pombos-bravos
e, descuidosas, mondando o grão caído da espiga
gorda, cantavam na terra das searas a perdiz
e a corcolher. Já as cerejas tinham bichos e a
cigarra emudecia longas horas, quebrantada
de tanto zangarrear. As manhãs, até toarem os
manguais, eram dum silêncio que se sentia do
mais pequeno tropel de tamancos estreloiçando nas ruas. (…)
(…) A serra da Lapa cobria-se de cinzas; a serra da Estrela, torva, opaca, com o
cabeçorro da Guarda à frente, tomava a forma de gigantesca figura humana,
deitada de bruços a sorver o sangue da terra na angústia imensa da sede. E
pegando de novo, hã-hã-hã, lá iam os malhadores…
A horas da janta, aparecia a senhora do
malhio; os pírtigos arrancavam uma
salva que nem trovoadas que se
encontram. Todos à uma urravam:
óóó!! E os ecos doutras eiras
respondiam: óóó!! A surriada
alagava as gândaras, tornava mais
pasmados os penedais pasmados,
e sacudia os horizontes ermos,
ruivos da brasa do meio-dia, a
tremulina tonta da canícula.
Aquilino Ribeiro,
Terras do Demo
,
Ed. Círculo de Leitores, 2009, pp. 34, 37
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